Conversa com… CLIFFORD ROSS

PT

Clifford Ross é um artista multimédia que se formou na Universidade de Yale em 1974, em arte e história da arte. Foca-se sobretudo na beleza e nas qualidades sublimes da natureza, através de meios realistas e abstratos – pintura, escultura, fotografia, animação por computador e vitrais. Os trabalhos mais conhecidos são as fotografias Hurricane Waves, captadas no mar enquanto estava amarrado por um cabo a um assistente em terra.
A sua obra foi exposta e amplamente coleccionada por museus de todo o mundo, incluindo o MoMA, o J. Paul Getty Museum e a National Gallery of Art . Tem sido assunto de ensaios de David Anfam, Quentin Bajac, Arthur C. Danto e Alexander Nemerov, entre outros. Em 2015, o MASS MoCA organizou uma exposição retrospetiva intitulada Landscape: Seen & Imagined.

Para mais informação visite www.cliffordross.com


Como surgiu a ideia de desenvolver um projeto de Arte na Nazaré?

A minha arte sempre esteve ligada à minha experiência com a natureza e com o sublime. Vivo faminto por aqueles momentos em que vejo e sinto algo muito além da minha existência normal, quando me sinto mais desperto – elevado, entusiasmado para um novo plano. O Grand Canyon proporciona isso. E o Eiger nos Alpes suíços. E o silêncio de uma névoa sobre um lago tranquilo.
A grande arte pode ter o mesmo efeito em mim. Uma pintura de Cézanne ou de Goya, esculturas de Bernini ou uma igreja projetada por Brunelleschi. A grande música de Mozart ou Lou Reed, ou Moby Dick de Melville. Simplificando, eu gosto de ficar descalço. É libertador ser humilhado por algo maior do que o ser em si mesmo.
E o que é maior ou mais emocionante do que uma onda da Nazaré?
Tenho fotografado ondas de furacões com a água pelo peito desde o final dos anos 90, geralmente com fato de mergulho e com um colete flutuante, amarrado por corda a um assistente que fica em terra. Por volta de 2003, tive a ideia de me pendurar num helicóptero através de um cabo para captar ondas grandes como as de Jaws e descobri um ex-piloto de helicópteros que esteve no Vietnam que me levou ao longo do rio Hudson para fazer alguns testes. Foi uma experiência fantástica, mas alguns dias depois ele telefonou-me a dizer que os amigos que tinha no Hawai acharam que a minha ideia era uma loucura – muito perigosa – e o meu plano entrou em hibernação. Vinte anos depois, a lâmpada acendeu. Drones e Nazaré.


No último ano esteve algum tempo na Nazaré para preparar este projeto com a sua equipa. Como tem sido a sua ligação à Nazaré?

Vim à Nazaré pela primeira vez em abril. O mar estava calmo, mas ao olhar para o promontório da Praia do Norte, conseguia sentir ondas enormes à espreita no Canhão da Nazaré, a perder de vista, algures no futuro. Parecia que estava no fulcro do mundo inteiro. Acho que levitei. O João Vidinha, um piloto de drones brilhante e natural da Nazaré, estava comigo e começou a rir-se e a abanar a cabeça. Trabalhamos juntos desde então. É um parceiro – e família. E é assim que tem sido com a própria vila.
A Nazaré é acolhedora a cada esquina. Os donos do Zulla Surf Village, o Capitão do Porto, o meu amigo Diogo do restaurante Sítio dos Petiscos, a estrutura da Praia do Norte… Há muita gente boa aqui. Agora, quando venho à Nazaré, sinto que estou a voltar para casa. Quando dois filhos adotivos da terra, Garrett McNamara e Alemão de Maresias, passaram pelo meu local de trabalho no Porto da Nazaré após o swell de 6 e 7 de novembro, senti-me ainda melhor do que na vida e trabalho que tenho no West Village de Nova York.


Quais são os principais desafios neste trabalho?

Quando conheci o Alemão, ele disse-me que eu tinha de ter surfistas nas minhas fotos para garantir que as pessoas conseguem apreciar a escala das ondas. Ele tocou exatamente no ponto – mas as minhas fotos de ondas não têm surfistas porque eu quero que o espectador seja o surfista, sozinho em frente a uma fotografia de uma onda que é muito grande, muito complexa e muito perigosa para ser penetrada. Quero levar o poder e a beleza destas ondas a outros. De certa forma, vejo estas fotografias como uma homenagem aos surfistas e à natureza, que é urgente preservar.

É apaixonado pelo mundo natural. Qual é a sua opinião sobre as alterações climáticas?

No final dos anos 90, quando comecei a fotografar ondas de furacões, o meu caminho estava definido para celebrar a natureza. O aquecimento global não estava no meu radar. Agora compreendemos que estamos a alterar o mundo natural – talvez de forma irreparável. Nesse sentido, a natureza já não é natural. Podemos até dizer que a natureza está a tornar-se artificial. Uma amiga fez-me uma pergunta muito pertinente: “As ondas de 100 pés da Nazaré vão tornar-se ondas de 200 pés?” Questiono-me… e é justo perguntar, “O que estou a comemorar, exatamente, com as minhas fotografias?”
Trabalho com alegria – mas a tristeza está no retrovisor.


Muitas vezes ouvimos falar do poder que a arte tem para mudar o mundo. Estamos a atravessar tempos conturbados a vários níveis. Até que ponto ainda há espaço para essa visão poética da arte?

É difícil explicar a razão pela qual a arte, que no máximo é poética, continua a ser feita. Há uma profunda necessidade humana nisso – para os artistas fazerem, para os outros verem. Isso mexe com a alma. A ciência e a arte esforçam-se para dar sentido ao nosso mundo de maneiras diferentes. Onde a ciência visa a precisão, a arte visa uma compreensão mais espiritual, abordando a condição humana. Deve ter algum significado o facto de que quando uma era acaba, uma civilização acaba, a arte perdura. As pessoas ainda fazem fila para ver a Capela Sistina. Os artistas nasceram para murmurar ou gritar: “Estou aqui. Isto é o que eu sinto. Isto é o que eu vejo. E ofereço-te a ti.”
A arte nunca tem prazo de validade.


Considerando a sua longa experiência, que conselho daria a um jovem artista?

Nunca desistas.

ENG

Clifford is a multi-media artist who graduated from Yale University in 1974 with a degree in art and art history. He is focused on the beauty and sublime qualities of nature, using both realistic and abstract means – through painting, sculpture, photography, computer animation and stained glass. His best-known works are his Hurricane Wave photographs, captured while tethered by rope to an assistant on land.
His work has been exhibited and collected widely in museums around the world including the Museum of Modern Art, the J. Paul Getty Museum, and the National Gallery of Art. It’s been the subject of essays by David Anfam, Quentin Bajac, Arthur C. Danto, and Alexander Nemerov among others. In 2015, MASS MoCA presented Landscape: Seen & Imagined, a major mid-career retrospective.

For further information visit www.cliffordross.com


How did the idea of developing an Art project in Nazaré come about?

My art has always been connected to my experience with nature and the sublime. I’m hungry for those moments when I see and feel something way beyond my normal existence, when I feel more awake – elevated, thrilled into a new state. The Grand Canyon does it. And the Eiger in the Swiss Alps. And the silence of a mist over a still pond.
Great art can do the same thing to me. A painting by Cezanne or Goya, sculptures by Bernini, or a church designed by Brunelleschi. Great music from Mozart or Lou Reed, or Melville’s Moby Dick. Simply put, I like having my socks knocked off. It’s liberating to be humbled by something bigger than oneself.
And what’s bigger or more exciting than a Nazaré wave?
I’ve been photographing hurricane waves while chest deep in the surf since the late 1990’s, usually in a wet suit and with a flotation vest, tethered by rope to an assistant on shore. Around 2003, I had the idea of hanging from a helicopter on a cable to shoot big waves like “Jaws” and found an ex-Vietnam helicopter pilot to fly me over the Hudson River as a test. It was a fantastic experience, but a few days later he called me to say his buddies in Hawaii thought my idea was insane – too damn dangerous – and my plan went into hibernation. Twenty years later the light bulb went on. Drones and Nazaré.


In the last year you have spent some time in Nazaré to prepare this project with your team. How has your connection to Nazaré been?

I came to Nazare for the first time in April. The sea was flat but looking at the promontory from the Praia do Norte, I could feel massive waves lurking in the Nazare Canyon, out of sight, somewhere in the future. It felt like I was at the fulcrum of the entire world. I think I levitated. Joao Vidinha, a mystically brilliant drone pilot and Nazare native was with me, and he just started laughing and shook his head. We’ve been working together ever since. He feels like a partner – and family. And that’s how it’s been with the town itself.
Nazare is welcoming at every turn. The owners of Zulla Surf Village, the Captain of the Marine Patrol, my pal Diogo at the restaurant Sitio dos Petiscos, the Praia do Norte organization… There are so many great people here. Now when I come to Nazare, I feel like I’m coming home. When two other adopted sons of the town, Garrett McNamara and Alemao de Maresias, dropped by my workshop in the port after the November 6-7 swell, it felt even better than the life and work flow I have in New York’s West Village.


What are the main challenges in this work?

When I first met Alemao, he told me I needed surfers in my photographs to be sure people could appreciate the scale of the waves. He had my goal dead on – but my wave photographs don’t have surfers in them because I want the viewer to be the surfer – alone in front of a photograph of a wave that’s too big, too complex, and too dangerous to be fathomed. I want to bring the power and beauty of these waves to others. In a way, I see these photographs as an homage to surfers and to nature, which we urgently must find a way to preserve.


You’re passionate about the natural world. What are your views on climate change?

In the late 1990’s when I started shooting hurricane waves, my path was set to celebrate nature. Global warming wasn’t on my radar. Now we understand that we are altering the natural world – perhaps irreparably. So, nature is no longer natural. We can even say that nature is becoming manmade. A friend of mine asked me a killer question: “Will Nazare’s 100-foot waves become 200 feet?” I wonder… It’s fair to ask, “What, exactly, am I celebrating with my photographs?”
I work with joy – but sadness is in the rearview mirror.


We often hear about the power that art has to change the world. We are going through troubled times on several levels. To what extent is there still room for this poetic vision of art?

It’s hard to explain why art, which at its best is poetical, keeps getting made. There’s a deep human need for it – for artists to make it, for others to see it. It moves the soul. Science and art strain to make sense of our world in different ways. Where science aims for precision, art aims for a more spiritual understanding, addressing the human condition. It must mean something that when an era is over, a civilization gone, the art endures. People still line up to see the Sistine Chapel. Artists are born to murmur or shout, “I am here. This is what I feel. This is what I see. I offer it to you.”
Art never has a past due date.


Considering your long experience, what advice would you give to a young artist?

Never quit.